O grupo Samel atuou junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para a aprovação do uso da proxalutamida no tratamento da Covid-19 no Brasil. É o que revelam documentos obtidos pelo site Vocativo e confirmados pelo Manaus 360°.
Segundo os documentos, o presidente do grupo Samel, Luís Alberto Nicolau, participou de uma reunião virtual na tarde do dia 8 de abril de 2021 com técnicos da Anvisa para discutir a aprovação e produção da droga em larga escala.
A reunião, registrada em ata pela Anvisa, contraria a versão divulgada pelo grupo Samel de que a rede hospitalar teria atuado apenas como “campo de pesquisa” do estudo e mostra o grupo amazonense agindo de forma ativa nas interlocuções pelo uso do medicamento.
Samel pediu análise da Anvisa
Na ocasião, Nicolau questionou se a agência reguladora não poderia avaliar os dados dos estudos conduzidos no hospital. Em resposta, a Anvisa informou que ainda não tinha acesso aos dados existentes no protocolo executado pelos pesquisadores da rede hospitalar.
De acordo com a ata da reunião, o encontro foi solicitado pela Segunda Diretoria da agência sanitária, que é responsável pela avaliação de qualidade, eficácia e segurança em medicamentos e alimentos.
Além de Nicolau, participaram da reunião o vice-presidente de produção e inovação em saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Marco Krieger; o gerente de medicamentos da Anvisa, Gustavo Mendes; e a assessora Roberta Meneses de Amorim.
Uso suspenso
Em setembro de 2021, a Anvisa suspendeu a importação e o uso da proxalutamida em pesquisas científicas no Brasil. A decisão se deu após veículos de imprensa publicarem indícios de fraude e violações éticas nos estudos, o que, segundo a Samel, são apenas “questões de ordem burocrática”.
Segundo a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) do Conselho Nacional de Saúde (CNS), o estudo apontou alto índice de eventos adversos graves, com 200 mortes classificadas, sem critério, como “definitivamente não relacionado à droga de intervenção”.
Ainda de acordo com a Conep, não foram apresentados documentos ou justificativas para o elevado índice de óbitos na condução do estudo, além de inconsistências e divergências dos dados apresentados em emenda ao protocolo original.
No ensaio clínico, a droga foi usada em pacientes tanto da rede Samel quanto em outros hospitais do Amazonas. O medicamento nunca foi usado em escala comercial e ainda não tem eficácia comprovada contra nenhuma doença.
Samel pediu prisão de jornalistas
Na última semana, a pedido do grupo Samel, o juiz Manuel Amaro de Lima, da 3ª Vara Cível e de Acidentes de Trabalho do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM), determinou o bloqueio de R$ 1,8 milhão da Editora Globo, responsável pelo jornal O Globo.
O grupo também pedia a prisão de jornalistas ligados ao periódico, mas o pedido não foi atendido. Os alvos do pedido foram o chefe de redação do Globo, Alan Gripp, e a colunista Malu Gaspar, que publicou as reportagens. A Samel também pediu a apreensão dos passaportes e carteiras de habilitação dos jornalistas.
Em direito de resposta publicado pelo O Globo, o grupo Samel afirma não possuir “qualquer experimento com a proxalutamida em andamento e não consta como participante ou coparticipante de nenhum estudo nesse sentido”.
No entanto, a empresa admite ter participado das pesquisas “na condição de campo de estudo”. Segundo o posicionamento, o uso da droga se deu “após avaliação feita por seu corpo técnico-científico em relação aos métodos de testagem propostos, num estudo duplo-cego, randomizado, placebo-controlado, em terapia de adição a terapia prevalente, este aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep)”.