Após todo o imbróglio envolvendo um possível erro que fez com que um veto enviado pela Prefeitura tenha chegado ao conhecimento da Câmara Municipal de Manaus (CMM) de forma tardia a vida já voltou ao normal na Casa. Apesar dos protestos solitários do vereador Amon Mandel (sem partido), o veto foi deliberado e mantido pela maioria, com apenas quatro votos contrários.
O veto, que causou polêmica e suspendeu a sessão da última quarta-feira (9), apareceu como prioridade nesta segunda. Sem dar muitos esclarecimentos, o presidente da CMM, David Reis (Avante), simplesmente ia levá-lo à deliberação, até que Amon pediu uma “questão de ordem” solicitando o comprovante do recebimento do veto dentro do prazo.
David Reis se limitou a responder que o prazo para deliberação começa a correr a partir da leitura do veto, explicitando a tese da Câmara para se defender da acusação de erro. Além disso, o caso, segundo o presidente, foi encaminhado à Procuradoria da Casa. Marcelo Serafim (PSB), que é líder do Prefeito na Casa, foi mais longe, e baseou a tese na forma como os vetos são tratados no Congresso Nacional.
“Somos um poder legislativo municipal e trabalhamos, portanto, por similaridade aos poderes que estão acima da gente. Vou dar um exemplo que pra mim é muito claro. O veto da pobreza menstrual, vetado pelo presidente Jair Bolsonaro em outubro do ano passado. Até hoje esse veto ainda não foi apreciado pelo Congresso. Então estaríamos com todo o Congresso Nacional paralisado? As votações do plano plurianual, do orçamento do governo, estariam anuladas? Não! Há um entendimento, nesse período da pandemia, que esses prazos estão sendo obedecidos de acordo com o conhecimento da Casa. E quando se dá o conhecimento da Casa? Quando o veto é lido em plenário. O que está valendo no congresso é o ato de leitura no plenário”, disse, revelando que apresentou o mesmo argumento na Comissão de Constituição e Justiça.
Amon usou as palavras de Marcelo Serafim para levantar outro projeto de lei, desta vez o 174/2021, do próprio Marcelo Serafim, que estaria aguardando sanção ou veto, na mesma situação do projeto de William Alemão, que gerou toda a polêmica. Mandel citou uma decisão de 2012 do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux na qual a apreciação do veto da redistribuição de royalities foi suspensa no Congresso até a apreciação de todos os vetos anteriores. O PL de Marcelo Serafim seria anterior ao de Alemão e o veto não consta no Sistema de Apoio ao Processo Legislativo (SAPL).
“O plenário é soberano, mas não para passar por cima das leis. Eu estava na minha questão de ordem e não deveria ter sido interrompido. A gente se baseia no próprio argumento do líder do Prefeito, que a gente atua se espelhando [no Congresso]. A decisão do STF diz que os vetos devem ser apreciados na ordem em que eles são feitos. Ou a gente escolhe se espelhar perfeitamente no que acontece no Congresso Nacional ou a gente segue regras diferentes. Não dá pra se espelhar num caso e no outro não pode mais. Se não for pra seguir o Congresso, que se siga o que está na Lei Orgânica, que não fala de leitura do veto, mas sim recebimento”, disse.
O assunto não durou muito. Após uma breve discussão sobre qual caminho seguir, a casa simplesmente optou por seguir com a ordem do dia, submeteu o veto à discussão e posteriormente à votação, onde ele foi mantido, com votos contrários de William Alemão (CIdadania), Amon Mandel (sem partido), Capitão Carpê (Republicanos) e Rodrigo Guedes (PSC).
Entenda o caso
A sessão da última quarta-feira (9) foi encerrada bruscamente diante da exposição de evidências que um erro grave teria sido cometido. Ainda no pequeno expediente, o vereador Amon Mandel (sem partido) chamou atenção para um veto ao Projeto de Lei 096/2021, de autoria do vereador William Alemão (Cidadania), que propunha a criação do “Brechó da Construção” – projeto que viabilizaria o recolhimento de sobras de construção, demolição e reforma de prédios, estabelecimentos comerciais e residenciais, mediante doação dos proprietários, para entrega a famílias de baixa renda e entidades religiosas e filantrópicas cadastradas.
O PL foi aprovado dia 20 de setembro e encaminhado para sanção ou veto do prefeito David Almeida (Avante), que teria, segundo a Lei Orgânica do Município (Loman), 15 dias úteis para se manifestar a favor – sancionando – ou contra, vetando o projeto. Caso sancionada, a lei passaria a valer conforme o texto publicado no Diário Oficial do Município (DOM), mas ao receber um veto, a Câmara precisaria colocá-lo em votação, para decidir por mantê-lo ou derrubá-lo. Caso optasse por derrubá-lo, a casa tem o poder de promulgar a lei e fazê-la valer ainda que o prefeito seja contrário.
No caso da lei proposta por William Alemão, o mais provável é que a CMM aderisse ao veto do prefeito, que tem em sua base aliada a maioria dos parlamentares.
Os prazos, nesse caso, fazem muita diferença para saber as consequência do equívoco. Enquanto o documento do veto data no dia 15 de outubro – ou seja, a Câmara o teria recebido ano passado – no Sistema de Apoio ao Processo Legislativo (SAPL) a data registra que a casa legislativa recebeu o veto apenas nesta quarta.
A exposição interrompeu a Ordem do Dia, que é o momento no qual as proposituras são postas à votação. O assunto foi discutido até que se chegou a um acordo para a suspensão da sessão.