Senadores da CPI da Covid-19 convocaram nove governadores para prestarem depoimento e a reação deles foi buscar o Supremo Tribunal Federal (STF) para suspender a “intimação”. Isso porque, os chefes dos Poderes Executivos estaduais entendem que a Constituição Federal de 1988 não permite que os membros da CPI sabatinem o presidente, Jair Bolsonaro (sem partido), e por uma equivalência, esse benefício se estenderia a eles.
Segundo a advogada Maria Benigno, a lógica usada pelos governadores para evitar a CPI da Covid-19 não se sustenta. Ela explica que, segundo uma Lei de 1952, a única com foco nas CPIs, as comissões podem convocar quaisquer autoridades do âmbito federal, estadual ou municipal, com apenas uma exceção. “Ou seja, não há exclusão de nenhuma outra autoridade abaixo do presidente”, esclarece.
Podem ficar calados
Fora a Lei 1579, Benigno também consultou a Constituição e o Regimento Interno do Senado. “A lei não impede que essas pessoas [governadores e prefeitos] sejam convocadas. Agora, se, por ventura, as perguntas entrarem no âmbito da atuação estadual [ou municipal], os governadores [ou prefeitos] podem se limitar a responder àquilo que tem a ver com o objeto de investigação da CPI”, revela a advogada.
“Se a parte que for depor entender que a pergunta pode, de alguma maneira, gerar uma incriminação à ela, ela pode requerer o direito de ficar em silêncio para não se autoincriminar”, explica Maria Benigno. Isso significa que, mesmo sem o habeas corpus, o alvo das perguntas dos senadores pode ficar em silêncio. Mas, a especialista conta que o documento emitido pelo SFT, vira uma espécie de “super trunfo” para mentir.
Habeas corpus é mentira liberada
Ao relembrar o caso do ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, que foi à CPI com habeas corpus, Benigno aponta que ele pôde mentir sem sair algemado do Congresso Nacional. “Acredito que ele teve o “escudo” do habeas corpus para poder mentir. Ele escolheu mentir a ficar calado. Para ele, era muito melhor dizer que não sabia, que não era bem isso, que foi interpretado errado… quando todo mundo sabe o que aconteceu. E, com o amparo do habeas corpus, ele não podia sofrer uma ordem de prisão”.
Vale lembrar que a CPI da Covid-19 tem como objeto inicial “apurar as ações e omissões do Governo Federal no enfrentamento da pandemia da Covid-19 no Brasil e, em especial, no agravamento da crise sanitária no Amazonas com a ausência de oxigênio para os pacientes”. Em seguida, esse objetivo foi alterado para possibilitar que governadores e prefeitos falem sobre a aplicação de recursos federais destinados aos Estados e municípios para combater a pandemia.
Sem anulação e com aposta
Ainda que os senadores passem do ponto na hora de sabatinar os governadores, Maria Benigno entende que a CPI não corre o risco de ser anulada. “No meu entender não vai gerar uma nulidade da CPI, mas se vai excluir do relatório [elaborado ao final da Comissão] aquilo que não tiver a ver com competência investigativa da Comissão. Mas, os senadores podem até encaminhar esses dados para os órgãos a quem compete investigar o governador”, elucida.
A aposta da advogada é que o Supremo vai permitir a presença dos governadores na cadeira de depoente da Comissão. Apesar dos nove governadores convocados recorrerem ao STF, com o apoio de mais 10 governadores que assinaram o pedido de suspensão da convocação – feita via Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF). “A depender da forma como vai ser pedido, acredito que o STF não vai barrar as convocações”.
“Isso porque vi como o Supremo se posicionou em algumas situações, não era quanto a governador, era sobre autoridades que entendiam que estavam fora o âmbito da investigação. Até agora, o que o Supremo decidiu que se estiver dentro do objeto a ser investigado, a CPI pode convocar qualquer autoridade [fora o presidente, como já abordado]”, analisa Benigno.
Governadores convocados e apoiadores
Caso a agenda da CPI se mantenha, o governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), vai ser ouvido pelos senadores dia 29 de junho. Além dele, estão agendados na CPI da Covid os governadores: Helder Barbalho (Pará); Ibaneis Rocha (Distrito Federal); Mauro Carlesse (Tocantins); Carlos Moisés (Santa Catarina); Antonio Denarium (Roraima); Waldez Góes (Amapá); Marcos Rocha (Rondônia) e Wellington Dias (Piauí). Também foi aprovado que sejam ouvidos o ex-governador Wilson Witzel (RJ) e a vice-governadora de Santa Catarina, Daniela Reinehr.
Outros que assinaram a ação, mas não foram convocados são os governadores: Rui Costa (Bahia), Ronaldo Caiado (Goiás), João Doria (São Paulo), Renato Casagrande (Espírito Santo), Paulo Câmara (Pernambuco), Cláudio Castro (Rio de Janeiro), Eduardo Leite (Rio Grande do Sul), Belivaldo Chagas (Sergipe), Renan Filho (Alagoas) e Flávio Dino (Maranhão).