A Câmara Municipal de Manaus (CMM) parece não conseguir passar muito tempo sem um escândalo. Nesta terça-feira (29), o vereador Amom Mandel (sem partido) usou seu tempo de fala na tribuna para denunciar um suposto sobrepreço na aquisição de câmeras fotográficas, microfones e outros equipamentos de mídia que compoem o “kit selfie”, adquirido pela Casa e distribuído aos vereadores.
Segundo a denúncia, o sobrepreço seria de cerca de 133% em cada kit, comprado com dinheiro público, pelo presidente da CMM, David Reis (Avante).
Denúncia
Em seu discurso, Amom afirmou que os materiais entregues aos vereadores são de modelos inferiores aos descritos no pregão que licitou a compra dos mesmos.
Ao enviar um ofício à Comissão de Licitação, o parlamentar teria recebido como resposta que não poderia ter acesso à dados da licitação, uma vez que ela foi concluída, encaminhando o caso à Diretoria Geral, que ainda não teria se manifestado.
“Eu gostaria muito de falar com propriedade sobre esses dados para saber o que de fato aconteceu nessa licitação. Pode não ter acontecido algo errado. Mas, infelizmente, a presidência da Casa não colaborou”, disse.
Na prática, a Câmara teria pago um valor superior à média de mercado e ainda por cima recebido produtos diferentes, de qualidade abaixo do que havia sido solicitado.
“Ainda que o equipamento fornecido fosse o mesmo que está no Diário Oficial, ele seria com um preço superior, aparentemente, do mercado. Qual foi o levantamento de mercado feito pela Câmara? Quais foram as lojas, os preços? […] Dá a impressão de que a presidência tem algo a esconder”, disse.
Denúncia ganha apoio
Mesmo com o plenário já bastante esvaziado, alguns colegas fizeram coro aos questionamentos de Amom. William Alemão (Solidariedade), por exemplo, disse que chegou a fazer uma pesquisa de preço do equipamento que chegou, mesmo sem perceber que ele era diferente do descrito no pregão, e devolveu o mesmo.
“Pra quê serve a transparência? Pra ela ser turva? Quando o kit chegou ao meu gabinete eu pedi para fosse feito um levantamento rápido na internet. A câmera que chegou, modelo SL3, custa R$ 5.589 e não é esse o preço que foi pago. Mesmo não percebendo que o equipamento estava diferente, não assinei o recebimento”, disse.
Jander Lobato (PTB), assumiu ter recebido o “kit selfie”, mas disse que foi informado que a diferença nos equipamentos se dava pelo recebimento de itens de qualidade superior, e não inferior, prometendo devolver o material caso as denúncias de Amom se confirmem.
“As verificações, pelas ligações que eu dei é que licitação foi ganha de uma máquina e nós recebemos outra, mas a que nós recebemos é superior. […] Vou correr atrás disso, verificar se as suas denúncias estão corretas e procurar o presidente desta Casa e se eu fui induzido ao erro, eu devolverei esse material”, assegurou.
Representação no TCE e no MP
Rodrigo Guedes (PSC), revelou que vai, junto com Amom, entrar com uma representação nos órgãos de controle para um parecer técnico sobre a qualidade dos equipamentos recebidos em comparação com o material que a Cãmara deveria ter recebido.
“Antecipo que faremos uma representação em conjunto nos órgãos de controle, Tribunal de Contas e Ministério Público, para que haja análise pelos órgãos legitimados a dar um parecer sobre o possível uso ilegal do dinheiro público”, completou.
Constrangimento
Capitão Carpê (Republicanos) disse estar, como vereador, cansado de dar explicações após os sucessivos escândalos da Câmara, e levantou a possibilidade de David Reis ter sido “induzido ao erro”.
“Estou constrangido de ter que ficar dando explicação quase toda semana por situações que vem acontecendo aqui nesta Casa. É quase constrangedor dizer que é vereador. Essa Casa precisa, primeiramente, se fiscalizar, para que possamos fiscalizar a Prefeitura. Estou cansado de dar explicações por algo que não veio do plenário. […] Caso essas denúncias do vereador Amom Mandel se confirmem, o presidente pode ter incorrido no crime de improbidade. Isso é muito grave”, ressaltou.
‘Kit Selfie’
A Câmara Municipal de Manaus gastou quase R$ 640 mil na compra de câmeras fotográficas e acessórios com a justificativa de fornecer aos vereadores, equipamentos para que eles pudessem divulgar suas ações. Os parlamentares apelidaram o equipamento de ‘kit selfie’.
Todos os 41 vereadores receberam, há cerca de duas semanas, em seus respectivos gabinetes, um kit com câmera fotográfica, que também grava vídeos, dois microfones, lentes e uma mochila para carregar todo o material. Alguns afirmam ter se recusado a assinar o recebimento do material e devoldido à presidência.
Todo o processo de licitação para compra foi feito no final de 2021. Na ata, um material de primeira. Ao todo, constam 42 máquinas fotográficas digitais profissionais, cada uma tendo custado R$ 13,6 mil, modelo Canon/EOS Rebel T7i, mais 42 mochilas para transporte de equipamentos fotográficos, por R$ 582 cada, da marca Kalione. Além disso, aparece também um flash que custa R$ 4.790, da Canon, um tripé profissional, no valor de R$ 1.470, da Exbom, e um kit iluminador com LED 18” bicolor de R$ 757, da Exbom.
Câmara se defende
Já na tarde desta terça, a Câmara divulgou uma nota à imprensa dizendo que três empresas venceram a licitação apresentando o melhor preço, que para a Casa, “condizem com parâmetros colhidos”. Uma outra justificativa é a subtistuição de equipamentos adquiridos há 10 anos. Confira a nota na íntegra:
“Sobre a aquisição de máquinas fotográficas para uso das assessorias de comunicação dos vereadores da Câmara Municipal de Manaus, a presidência da Casa legislativa ressalta que a compra se deu por meio de processo licitatório, modalidade pregão presencial, realizado em dezembro de 2021, com publicação do resultado no Diário Oficial Eletrônico da Câmara de Manaus do dia 30 do mesmo mês, ou seja, seguindo todos os trâmites da legislação vigente, que incluem a ampla divulgação, para conhecimento da sociedade, em especial dos órgãos de controle externo.
Venceu o certame o melhor preço apresentado pelas empresas participantes do processo, condizente com os parâmetros de preços colhidos pela própria cotação, que considerou valores apresentados pelo mercado local à época do lançamento do edital da referida licitação pública, ou seja, ainda no ano passado. Na ocasião, 15 empresas adquiriram o edital, sendo que três concorreram e venceram o pregão presencial.
Vale destacar ainda que além da máquina fotográfica digital, os gabinetes dos vereadores receberam acessórios e equipamentos complementares para o trabalho de produção e veiculação de imagens e vídeos, que possibilitam a divulgação das atividades parlamentares, como microfones, iluminadores portáteis e mochila para o adequado acondicionamento e transporte do respectivo conjunto de equipamentos. No caso da máquina fotográfica, a atual substitui equipamento adquirido há dez anos pela Câmara de Manaus, portanto, que já apresentava avançado processo de desgaste”, diz a nota.