O governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) escondeu mais de mil relatórios e alertas produzidos pela Agência Brasileira de Inteligência, que pontuavam a grave situação causada pela pandemia de Covid-19. A gestão de Bolsonaro determinou sigilo sobre todas as informações, incluindo os alertas para a falta de oxigênio na cidade de Manaus, ocorrida em 14 de janeiro de 2021.
Em paralelo, o ex-presidente boicotava medidas de controle da pandemia – como distanciamento social e uso de máscaras – e atacava as vacinas com acusações falsas e insinuações xenofóbicas contra a China.
As informações forma publicadas pelo jornalista Mateus Vargas, no jornal Folha de S. Paulo. Os arquivos foram disponibilizados via Lei de Acesso à Informação (LAI).
Os documentos atestam que Bolsonaro ignorou as recomendações dos técnicos do Ministério da Saúde, feitas a partir dos relatórios de agentes da Abin e do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
Ao longo da pandemia, o ex-presidente contrariou os próprios servidores ao promover aglomerações e desacreditar o potencial destrutivo do vírus SARS-Cov-2. Um dos relatórios apontava que o Brasil atingiria, no pior cenário, o número de 338.558 mortos pela doença em 7 de abril de 2021. Quando chegou o dia, o país registrou 341.097 mortos.
Crise em Manaus
Em janeiro de 2021, os agentes passaram a produzir relatórios sobre a falta de oxigênio na cidade de Manaus. À época, Bolsonaro alegou que o governo “foi além daquilo que somos obrigados a fazer”. Contudo, tanto o ex-presidente quanto o então ministro da Saúde e atual deputado federal pelo Rio de Janeiro, general Eduardo Pazuello (PL), foram avisados mais de uma vez sobre a possibilidade.
Integrantes do Governo do Amazonas, a empresa White Martins e até mesmo uma parente de Pazuello avisaram sobre o risco de falta de oxigênio pelo menos quatro dias antes do colapso na rede de saúde manauara.
“Quando eu cheguei na minha casa ontem, estava a minha cunhada, com o irmão sem oxigênio nem para passar o dia. ‘Acho que chega amanhã.’ ‘O que você vai fazer?’ ‘Nada. Você e todo mundo vão esperar chegar o oxigênio e ser distribuído.’ Não tem o que fazer. Então, vamos com calma”, afirmou Pazuello.
Contudo, o oxigênio transportado por aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) veio com quantidades muito inferiores aos pedidos. Dias depois, o oxigênio acabou.
Desgaste
Além da gravidade da pandemia, os agentes aferiram e alertaram sobre o desgaste político que o presidente sofreria em caso de má gestão da crise sanitária.
Um relatório cita o caso da decisão do Ministério da Saúde, de junho de 2020, em atrasar a divulgação dos novos casos e óbitos para as 21h. Na época, Bolsonaro debochou da emissora TV Globo, a qual se referiu como TV Funerária.
“O horário adequado. Se ficar às 21h, tudo bem. Não vamos é correr às 6 da tarde para atender a Globo, a ‘TV Funerária’. Não tem cabimento isso. Consolida com clareza, com precisão, a data certinho”, declarou.
Em resposta, após a divulgação dos dados horas mais tarde, a TV Globo chamou um plantão durante a exibição da novela ‘Fina Estampa’ para informar o número de casos e óbitos. O jornalista e âncora do ‘Jornal Nacional’, William Booner, voltou à bancada para divulgar o boletim.