Os vereadores da Câmara Municipal de Manaus (CMM) resolveram municipalizar uma pauta federal nesta terça-feira (23). A partir de um pronunciamento do vereador Professor Samuel (PL), a rodovia BR-319 ocupou mais de quarenta minutos da sessão entre respostas e comentários dos parlamentares. Além do discurso de desenvolvimento que remonta ao período dos militares na década de 70, vereadores direcionaram ataques à ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede), por conta da oposição que ela faz à pavimentação da estrada sem um estudo de impacto ambiental profundo.
O vereador Samuel começou o discurso afirmando que a população não entende as falas sobre proteção ambiental da ministra em relação à BR-319, pois a estrada estaria sendo pavimentada, não construída, e afirmou que a falta da rodovia isola a região.
“A [ministra] Marina Silva diz que [a estrada] vai mexer com o meio ambiente. Eu não entendo isso. Uma coisa que já existe, você dizer que vai mexer com o meio ambiente. E o Amazonas, a preservação é muito grande, 97%. Que seja 90! Por que não podemos fazer isso? Por que temos que conservar puramente? Nós vamos ficar aqui, lutando com a Zona Franca, com o pires na mão, e tendo a possibilidade de nós termos uma ligação com o restante do Brasil. Ridículo isso!”, disse.
Professor Samuel ainda acusou Marina Silva de não pensar nos brasileiros moradores de Manaus e emendou criticando a negativa do Ibama à perfuração de petróleo na foz do rio Amazonas pela Petrobras.
Anti-ambiental
A maior parte dos vereadores endossou o discurso de Samuel. Elan Alencar (DC), por exemplo, citou as altas despesas para viagens de balsa como uma das razões para defender o asfaltamento da BR-319 e também criticou Marina Silva, a quem acusou de perseguir o estado do Amazonas por, supostamente, impedir o desenvolvimento do estado com a fala da preservação ambiental que, segundo ele, “não convence mais”.
O vereador William Alemão (Cidadania) encarnou o finado ex-presidente Jânio Quadros ao falar de “forças que insistem em dizer que a BR-319” provocam “impacto ambiental gigantesco”. O ex-dono do Porão do Alemão também usou o caso da crise de oxigênio para defender a pavimentação, relatando o atraso na chegada de cilindros que foram enviados por terra.
Além dos dois, os vereadores Kennedy Marques (PMN), Dione Carvalho (Patriota), Dr. Daniel Vasconcelos (PSC), Lissandro Breval (Avante), Marcel Alexandre (Avante) e Everton Assis (União) reiteraram a defesa do discurso anti-ambiental em prol da pavimentação da BR-319.
As surpresas
Dois vereadores, contudo, se destacaram na sessão, pela defesa e pela crítica. O vereador Sassá da Construção Civil, líder do PT na CMM, mesmo partido do presidente Lula, criticou profundamente a ministra Marina Silva, chamando-a de traidora, e disse que o não asfaltamento da estrada é uma “questão política”.
“No governo passado, ela traiu o Lula e foi para outro partido. Passou anos afastada, o Lula assumiu o poder e ela voltou de novo para ser ministra do Meio Ambiente. Porque ela não entende nada de meio ambiente. Porque no estado dela ela não foi candidata, foi candidata por São Paulo. Nossa BR tem que sair sim, porque a gente tem maneiras de a gente não prejudicar o ambiente. Os estados não têm condições, por que aqui não pode?”, disse.
Sassá ressaltou ainda que o problema da BR-319 era independente de Lula e do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), sendo uma questão política regional.
A segunda surpresa foi do vereador Bessa (Solidariedade), único parlamentar que saiu em defesa de Marina Silva durante a discussão. Apesar de não discordar de todos os posicionamentos – concordando que a estrada tiraria o Amazonas do isolamento – relembrou que a BR-319 está intrafegável desde 1988 e que todos os governos subsequentes não cumpriram as promessas de asfaltar a estrada.
Contudo, Bessa não concordou que a culpa seria integralmente de Marina Silva.
“Colocar aqui a culpa na ministra Marina Silva, da minha parte, seria leviano nesse momento. Porque o governo que passou, quatro anos, tratou o meio ambiente de forma desornada, liberou tudo e não conseguiu avançar em nada. Essa é a realidade. Houve garimpos desordenados, houve situações de desmatamento desordenadas, isso é fato”, destacou.
O vereador também destacou o esvaziamento do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) no Amazonas durante a gestão de Bolsonaro. As atividades foram transferidas para o Dnit de Porto Velho. O ato, segundo o vereador, sucateou o órgão na filial amazonense e há mais de um ano não havia ações de pavimentação nas estradas. Portanto, na visão de Bessa, seria leviano cobrar a atual administração do órgão e a ministra Marina pelos problemas nas rodovias.
Ainda assim, Bessa afirmou que Samuel não estava sendo “politiqueiro” como candidatos que usam a estrada como bandeira política e que o assunto deveria ser tratado de forma séria pela pasta do Meio Ambiente e pelo Dnit.