Os vereadores de Manaus começaram a semana do jeito que mais gostam: com discussões que não levam a lugar nenhum. A principal pauta desta segunda-feira (14) foi sobre o filme “Como se tornar o pior aluno da escola”, do comediante Danilo Gentili, classificado pelos parlamentares como “pornografia infantil”. O problema é que os bastiões da moral e dos bons costumes chegaram apenas cinco anos atrasados, uma vez que o filme é de 2017.
A discussão começou com a propositura do vereador Luís Mitoso (PTB) de um projeto de lei que visa instituir a Semana de Promoção da Autodefesa de Crianças Contra a Vitimização Sexual, que caso aprovada, vai desenvolver ações nas escolas abordando o tema sempre no mês de maio. Ao explicar a inspiração para o projeto, Mitoso citou o filme, protestando contra o fato de ele estar disponível na Netflix com classificação indicativa não recomendada para menores de 14 anos, e que a obra apresenta, por exemplo, cenas de sexo explícito.
“Esse filme tem demonstração do que é ser contra a família. É uma confusão que está havendo entre liberdade e libertinagem. Isso é uma ação danosa para os jovens, e eu me pergunto: onde que tá o ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente] ?. Só o nome do filme já é um atentado contra os nossos jovens. Tem cenas obscenas. Gostaria de pedir a aprovação célere do meu projeto de lei para que a gente possa ir contra esse filme que tem cenas de sexo explícito”, disse.
O protesto de Mitoso foi endossado por vários outros vereadores, que também fazem parte da Frente Parlamentar em Defesa da Família e dos Valores Cristãos da Câmara Municipal de Manaus (Fepacri), que inclusive fez uma moção de repúdio contra o filme, conforme o vereador João Carlos (Republicanos).
“O filme contém cenas inapropriadas e desconstrutivas aos valores da moral e da tradcional família brasileira. No filme, percebemos cenas interpretadas pelo ator Fábio Porchat verbalizando a vontade de satisfação sexual de seu personagem na frente de dois jovens adolescentes com indicação clara do uso de suas partes íntimas. Repudiamos toda e qualquer produção cinematográfica que induz à prática de ato de libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia envolvendo criança ou adolescente”, completou.
Filme polêmico
Na estória, dois estudantes adolescentes que estão no último ano do ensino fundamental têm dificuldades para cumprir as regras da escola onde estudam, que no roteiro é descrita como “politicamente correta”. Um dia eles encontram, no banheiro do colégio, um diário escrito por um ex-aluno com dicas para instaurar o caos na escola sem ser notado.
A cena polêmica que virou alvo de protestos nos últimos dias, no filme, abre o segundo ato. Após achar o tal diário, os protagonistas vão em busca do autor tendo como única informação o nome do dono do caderno, escrito numa etiqueta.Através de uma rápida busca na internet, eles vão até o um endereço no centro da cidade e encontram o dono do caderno (Fábio Porchat), mas descobrem que não foi ele quem fez as dicas. Na verdade o ex-aluno que escreveu havia, anteriormente, roubado o caderno do homem que estava diante dos protagonistas.
Deixando escapar aos poucos que havia sido vítima de bullying por parte do colega que roubou seu carderno, o homem acaba se revelando um pedófilo e tenta abusar dos protagonistas, que conseguem fugir.
Cortina de fumaça?
“Como se tornar o pior aluno da escola” foi lançado em 2017, tem o roteiro oriundo de um livro lançado em 2009, já esteve nos cinemas, já foi exibido na TV aberta e atualmente figura em seis streamings diferentes. No IMDB, que avalia filmes com nota de 0 a 10, a obra, que não contém cenas de sexo explícito, aparece com pontuação 5.4, considerada baixa.
Nos últimos dias, o filme parece ter entrado, de alguma forma, na bolha conservadora e bolsonarista, que de repente descobriu a existência do mesmo e se revoltou, atacando os comediantes Danilo Gentili e Fábio Porchat, que atuam na obra, sendo que o primeiro é, também um dos roteiristas. O ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres, chegou a se manifestar neste domingo (13), se referindo obra como “asquerosa”.
Um gancho utilizado para justificar a revolta foi a entrada do filme no catálogo da Netflix, o streaming mais popular do Brasil, com estimativa de cerca de 20 milhões de assinantes no país. Porém, a obra apareceu como novidade por lá no início de fevereiro deste ano, portanto, há mais de um mês.
Curiosamente, várias manifestações em câmaras municipais e assembléias legislativas espalhadas pelo Brasil aconteceram de forma praticamente coordenada nesta segunda-feira (14). Coincidentemente, nos últimos dias Brasil teve um aumento de 18% no preço gasolina, que mexe com o valor de diversos outros produtos e serviços, e que se soma aos diversos outros aumentos do combustível nos últimos anos.